Filhos de Sangue e Osso — O Poder dos Orixás

Filhos de Sangue e Osso é um romance jovem adulto de fantasia, escrito por Tomi Adeyemi, lançado no Brasil pela Editora Rocco.

A narrativa aborda uma nação cuja conexão com a magia dos orixás foi extirpada para controlar os “maggots” (larvas, em tradução livre), e as tribulações de Zélie, a protagonista, para recuperar essa conexão, enquanto ela e os seus são perseguidos por serem larvas, apesar de não terem mais acesso à magia.

O ponto mais forte do livro – para além do belíssimo projeto gráfico da edição capa dura – é a aplicação da cultura e história do povo Yorubá e seus orixás para dar forma a um mundo fantástico e afrocentrado. Foi interessante ver o tema do colorismo ser abordado em um cenário onde não há o ideal cultural e estético da branquitude.

A escrita de Tomi Adeyemi é muito gostosa e imersiva, e faz com que a mágica, a dor e o sofrimento saltem das páginas.

A leitura, no entanto, é uma montanha-russa conflitante. Uma parte desse conflito partiu do meu gosto pessoal. Não leio muito literatura YA porque a onipresença de subenredos românticos desnecessários não me agrada (como já falei aqui), e a Tomi quase faz o leitor pensar que a história, por mais inovadora e refrescante que seja com seu mithos, iria cair direitinho em certos clichês do gênero em relação aos subenredos românticos.

Quase.

Capa do livro

O livro tem, na verdade, quatro personagens principais. Zélie e Tkain, seu irmão mais velho, Amari, a princesa de Orisha, e Inan, seu irmão mais velho, o herdeiro do trono. Sim, o mesmo trono que ordenou a execução sumária de todos os adultos larvas na noite que a mágica foi extirpada, a mãe de Zélie entre eles.

Durante a história, há uma espécie de troca-troca, e eu estava bastante preocupada em relação ao que seria de Inan e Zélie. Não quero dar spoiler, mas acredito que o final seja satisfatório para quem está cansado de arcos de redenção catalisados pelo amor romântico.

Já não posso garantir nada para as pessoas que curtem finais felizes.

Outra questão do enredo é o tropo do grupo oprimido que um dia foi opressor, o motivo real de pessoas que nem Zélie, capazes de se conectar com os orixás e usar seus poderes, serem perseguidas e caçadas em Orisha. Um dos pontos de conflito é a possibilidade de pessoas que nem Zélie retornarem ao seu papel de opressor ao recuperarem seus poderes. Não sou fã desse tropo, e fiquei bastante preocupada com o rumo da narrativa conforme a protagonista se questionava sobre seus poderes.

Novamente, Tomi salva a história no último instante.

Com essas duas situações resolvidas, a minha única crítica à Filhos de Sangue e Osso é a construção geral do enredo. Alguns pontos da história passam despercebidos de tão rápidos, enquanto em outros pontos o enredo se arrasta. Entretanto, ao refletir sobre a figura completa dos arcos dos personagens, em especial da Zélie, posso respeitar a decisão da autora e da edição.

Concluindo, Filhos de Sangue e Osso é uma leitura muito interessante do ponto de vista do worldbuilding, mesmo que seja um pouco agoniante ver um cenário tão fascinante quase cair nos erros de outras obras do gênero jovem adulto. Para quem tem a saúde cardiovascular em dia e aguenta momentos de tensão, é uma excelente obra.

Digue