Entrevista com Thais Lopes – Arroz, feijão e farofa

Thais Lopes é uma escritora de fantasia urbana e ficção científica, contando com mais de 20 obras publicadas na Amazon. Sendo uma das autoras nacionais mais bem-sucedidas que conheço, decidi trazê-la para cá para compartilhar a sua jornada como escritora e com a autopublicação (eu mesma ainda estou na parte que nem sei o que estou fazendo, então achei melhor buscar alguém que soubesse rs).

Para quem quiser dar uma olhada no trabalho dela, basta clicar aqui.

Usina de Universos: Arroz com feijão das entrevistas de escritores: Quando e por que você começou a escrever? Como descobriu qual era o seu gênero preferido?

Thais Lopes: Eu escrevo histórias literalmente desde que aprendi a escrever. Tinha vários bloquinhos cheios de histórias de quando eu era beeeeem criança mesmo, isso sempre foi um vício. Agora, escrever “a sério”, pensando em publicar e tudo mais, foi só a partir de 2009. Eu já tinha uma pilha de cadernos e fichários de histórias, a maioria nunca terminada. Já tinha tentado publicar antes (ou melhor, meu pai resolveu tentar mandar uma história minha para uma editora e obviamente não deu certo), mas essa coisa toda de “ser autora” parecia totalmente fora da realidade. Aquele ideal inalcançável. Até que pensei o “por que não?” e resolvi tentar.

E sobre gênero preferido… Eu cresci lendo de tudo um pouco. Minha mãe é professora de português e me enfiou todo tipo de livro desde bem nova. Cresci com Julio Verne, Agatha Christie, Umberto Eco, Tolkien, junto com coleção Vaga-lume e clássicos brasileiros. Não sei de onde veio a paixão pela literatura fantástica mesmo, mas foi algo que sempre fui atrás. Sempre tentei achar mais livros, revirava a biblioteca pública atrás de fantasia e ficção científica, comecei a tentar ler em inglês meio que “na marra” para pegar os livros que o pessoal que eu conversava em fóruns de bandas indicavam… E quando vi já tinha me apaixonado. A partir daí, a questão de “descobrir” mesmo qual era meu cantinho veio um pouco da questão de identificação mesmo. Eu gosto de sentir os personagens, torcer por eles, como pessoas, e não necessariamente por uma causa. Acabei me afastando da alta fantasia por causa disso e indo parar na mistura louca da fantasia urbana e os gêneros próximos assim.

 UU: Em que ponto da sua jornada de escritora você decidiu começar a publicar?

A própria, ao vivo e em cores

TL:Quando eu olhei para aquela pilha de histórias que nunca mostrava para ninguém (na época eu não tinha coragem nem de postar em site de fanfic) e comecei a pensar que talvez pudesse realmente fazer alguma coisa legal. É meio estranho pensar no “quando decidiu”, porque eu tive o momento de pensar que era possível, mas isso foi quatro anos antes de eu ter uma história “pronta” (foco nas aspas). Se bem que talvez isso seja porque eu sou meio neurótica com as coisas. Passei esses quatro anos pesquisando o que conseguia sobre o mercado, vendo algumas editoras novas aparecendo, dando treta (é, isso não é de hoje) e morrendo. Conheci um pessoal de editoras especializadas em literatura fantástica nacional, fui conversando com eles e vendo como a coisa toda realmente funcionava, vendo o que eu ia fazer e como. No fim das contas, a decisão do “ok, vamos lá com isso” foi mais por pressão dos amigos que estavam acompanhando a história do que uma coisa minha mesmo.

UU: Por que a autopublicação?

TL: Quando eu comecei, meu sonho também era ser publicada por uma editora. É assim que o mercado funciona, não é? Para ser autora, uma editora tem que te publicar. Era bem isso que eu pensava, então fui atrás de editoras. Quase entrei em uma ferrada, logo de primeira. Tive aquelas rejeições de praxe (as que a editora nunca te responde) das editoras focadas em literatura fantástica que eu mandei (na época eu resmunguei muito, hoje em dia eu olho e penso que é, nem por milagre teriam me aceitado, meu texto ainda estava muito cru). Então resolvi olhar para as outras editoras, em geral. Saí mandando o original. E aí começaram a chegar as respostas aceitando. “Adoramos seu material, segue a proposta para publicação”. E vinha a proposta para imprimir uma tiragem considerável, com distribuição, talvez tradução, etc, etc, se eu só estivesse disposta a pagar alguma coisa entre nove e dezesseis mil reais. Acho que todo mundo que acompanha o mercado literário já ouviu essas histórias, não é?

Enfim, eu já tinha pesquisado a questão de custos o suficiente para saber que isso era ferrada, então comecei a olhar outras opções. Eu já lia muitos ebooks, então por que não lançar em ebook? Era mais simples, custo menor, e enquanto isso eu podia começar a pesquisar sobre como fazer o físico por conta própria.

No fim das contas, fui parar na autopublicação porque vi que o que conseguiria com editoras não era para mim, não só por questão de custo. O trabalho que eu via delas (dessas pagas) não me agradava, então não ia me endividar e colocar minha família toda louca tentando levantar dinheiro para publicar com elas. Melhor fazer as coisas eu mesma.

UU: Quando a autopublicação se tornou um negócio para você? Era seu objetivo desde o princípio ou aconteceu aos poucos?

 TL: No começo, eu tinha muito na cabeça que não dá para se viver de livros no Brasil, a menos que você seja um best-seller com nome gigantesco contratado por alguma editora mega conhecida e tudo mais, então a autopublicação era só a forma de eu colocar minhas histórias no mundo. Depois dos amigos colocando pressão para lançar o primeiro, das resenhas, do pessoal pedindo mais, me veio a questão de que eu podia não estar em editora nem nada, mas tinha pessoas que queriam ler minhas histórias, então era só isso que importava. Não tinha nenhuma ambição de fazer disso um negócio, viver disso de qualquer forma. Só queria não ter prejuízo com os livros (e por milagre consegui isso).

Leitores recorrentes do Usina sabem meu apreço por um bom sexo interespécie

Aí os imprevistos da vida aconteceram e a empresa onde eu trabalhava fechou o escritório na minha cidade. Resolvi correr o risco e começar a fazer trabalhos freelance dentro do meio literário, pegando capas, diagramações, e depois revisões. Com o tempo, passei a pegar leitura crítica e traduções também. Nisso eu conheci muita gente de meios com os quais eu não tinha contato normalmente, especialmente as meninas do romance. E foi conversando com elas que eu vi que essa questão de “não dá para viver de livro” é bobagem. Ou melhor, é bobagem se você não se prender aos modelos tradicionais e tiver consciência de que está fazendo um produto para ser vendido.

A partir daí, eu voltei no momento “louca da pesquisa”, analisando como elas faziam as coisas. Divulgação, ritmo de lançamentos, como funcionava a questão de público e tudo mais. É um mercado, no fim das contas, e eu precisava aprender como esse mercado funcionava. E, para minha surpresa, não era um bicho de sete cabeças. Não era 100% uma questão de dar sorte nem nada do tipo, era realmente uma questão de mudar um pouco de ponto de vista: ao invés de ver os livros só como “arte”, aquela coisa abstrata e distante, passar a vê-los como um produto. Eu sei que muita gente ainda vira a cara para essa noção, mas é a verdade. Se está no mercado, se está à venda, é um produto. Foi quando entendi isso de verdade que decidi correr atrás de viver dos meus livros.

UU: Como equilibrar entre escrever o que você quer, e escrever o que vai vender?

TL: O que funcionou para mim foi achar um meio termo, por assim dizer. Achar o ponto onde o que realmente vende (não adianta tentar negar, o maior público consumidor de ebooks é o de romance. Não é à toa que os mais vendidos da Amazon são praticamente só romances) conversa com o que eu gosto de escrever. E isso também não foi difícil. São dois subgêneros que já existem há anos: romance sci-fi e romance paranormal. O mais difícil para mim, como autora, foi desconstruir essa mentalidade que reduz o romance a algo sem importância. Cresci fugindo de todos os “livros de menininha”, porque eu era “diferente das outras meninas”, era a menina que andava com os caras, leitora de fantasia, não ia perder meu tempo com esse tipo de coisa. Machismo nosso de cada dia. Essa foi a maior dificuldade: vencer o meu preconceito contra o gênero. E, no fim das contas, o resultado foi muito melhor do que eu pensei que seria.

UU: E, por último, quais são suas farofas favoritas?

TL:Ai gente… Acho que essa pergunta quase consegue ser pior que a “qual seu livro favorito” HAHAHAHAHAHAHAHA

O que eu gosto das farofas é quando elas me pegam de surpresa. Tipo um certo livro onde usam química (aquela coisa de s1, s2, etc) pra explicar ifrits e djinns. Ou outro que colocou uma equipe de faxineiros como protagonistas (e esse é sci-fi, ainda por cima). As misturas de mitologias e criaturas em geral, especialmente quando trabalham mitologias que normalmente são ignoradas.

Mas no fim das contas é só isso que eu quero mesmo: alguma coisa que me surpreenda, porque já tem muita coisa parecida com muita coisa espalhada por aí.

 

 

 

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