Naondel – Mulheres Ao Mar

Naondel, escrito por Maria Turtschaninoff, foi publicado aqui no Brasil pela Editora Morro Branco mais cedo este ano, e traduzido por Lilia Loman e Pasi Loman (disponível para compra aqui). É o segundo livro da trilogia “As Crônicas da Abadia Vermelha”, cujo primeiro livro eu já falei sobre nesse mesmo site que vos fala.

Enquanto Maresi era uma narrativa focada no ponto de vista de sua protagonista homônima, Naondel é a história de várias mulheres e garotas, onde acompanhamos o surgimento da Abadia Vermelha pelos olhos de suas fundadoras e a preparação para a jornada marítima até a ilha onde a Abadia é fundada. Outra diferença entre as duas obras é que o tom bucólico de Maresi é quase inexistente em Naondel; além disso, o horror de Maresi é, em grande parte, fantástico. O horror de Naondel, apesar da fantasia da história, é assombrosamente real.

Pois, apesar de haver vários pontos de vista, o antagonista é o mesmo para todas: um personagem violento e manipulador. E, como não podia deixar de ser, também é um estuprador. Para colocar a cereja no topo do bolo, também é um pedófilo. Não posso colocar o nome dele na roda porque seria spoiler – um spoiler bem óbvio, mas de toda forma não quero estragar esse mistério.  

As cenas de estupro de Naondel acontecem em sua maioria fora da página, mas o livro tem um aviso de gatilho sobre violência sexual que acredito ser muitíssimo necessário.

Capa da obra

O primeiro ponto de destaque do livro é o elenco de personagens femininos, tanto principais quanto secundários. Exploramos a experiência de ser mulher sob diversos pontos de vista: o livro cobre a feminilidade em todos os tons, orientações sexuais, expressões de gênero, e, para a minha grande surpresa, não exclui do debate mulheres trans, com a presença de uma personagem feminina não-binária.

E uma parte da diversidade do elenco feminino da obra se deve ao criativo worldbuilding da história. Essas personagens vieram uma de cada lugar, cada uma carregando consigo uma vida e uma cultura diferente. No primeiro livro da trilogia, vemos muito pouco do que há fora da Abadia Vermelha. Em Naondel, percorremos o mundo de Maria Turtschaninoff pelos olhos de várias mulheres, e é fantástico a diversidade de cenários construídos para uma só história.

Se falando do worldbuilding, apreciei bastante a atenção da autora para o aspecto político, econômico e geográfico da construção da narrativa e de seu cenário fantástico, mesmo que as protagonistas, por serem mulheres, não estivessem em posição de observar esses desenrolares de perto.

Voltando a falar das personagens, todas as protagonistas são personagens carismáticas, sem cair na perfeição. São mulheres reais, com seus dilemas, erros e defeitos, que se tornam amigas e irmãs, mas nem por isso sempre se dão bem. Um grande fator para o carisma desse elenco são mesmo suas falhas, pois cria maior verossimilhança e, do meu ponto de vista de leitora mulher, maior identificação com todas elas.

O antagonista que não nomearei nesta resenha não é lá um personagem de todo complexo para uma sommelier de vilões que nem eu, mas, considerando o foco da narrativa, não era necessário que o fosse, e suas ações não perdem a credibilidade por ele ser um personagem menos desenvolvido.

De todo, Naondel para mim é um bom exemplo de obra que de fato traz representatividade feminina, uma boa e cuidadosa construção de worldbuilding, aliadas a uma escrita excelente e personagens carismáticos. No geral, um excelente livro que sou muito feliz de ter em minha prateleira.

Agora, minha grande ressalva com essa história é um spoiler, que colocarei a seguir:

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