A Cabeça do Santo é um romance escrito por Socorro Acioli, uma autora cearense, e publicado pela Companhia das Letras em 2014. Nele, acompanhamos Samuel, que vai para a decrépita cidade de Candeia em busca do pai, e acaba descobrindo que pode ouvir as orações dedicadas ao Santo Antônio. A partir daí, ele começa a utilizar seu poder para mudar de vez a cidade de Candeia e descobrir quem é a voz que, ao invés de orar, canta, todo dia às cinco da manhã e às cinco da tarde.
Decidi resenhar este romance no site por ser, no mínimo, algo adjacente à ficção especulativa. Apesar de muito da história não ter nada a ver com fantasia, o dom fantástico de Samuel é o coração pulsante da narrativa, a questão central de tudo. Pelo que sei, esse romance foi trabalhado na oficina do Gabriel García Marquez, então ele envereda mais pelo lado do realismo mágico.
E sobre o que achei: em primeiro lugar, a prosa é muito agradável de ler. Ora é emocionada, ora é arguta e cínica, ora é lírica e poética. A forma da linguagem se transforma e se transmuta ao longo dos diversos momentos da narrativa, se adaptando a situação. Em especial, gostei do tom irônico que a narrativa adota nos momentos de bom humor, que expõem as contradições das crenças religiosas.
O cenário da história em si é um dos pontos fortes, em especial no tocante à história de Candeia, que não é uma cidadezinha abandonada no interior do Ceará por alguma condição intrínseca. Ao longo de A Cabeça do Santo, vamos entendendo a sequência de acontecimentos políticos e históricos que levou o local à ruína; também vemos o renascimento da cidade, que se torna um polo religioso no sertão do Ceará.
Apesar do Samuel em si não ter uma das personalidades mais carismáticas que já vi enquanto protagonista, os personagens secundários formam um elenco interessante, cada qual com sua vida, desejos e objetivos, e o desejo de saber mais sobre eles e suas histórias (e o que aconteceria a eles a seguir) me impeliu a continuar lendo a história.
No fim, porém, dei 4 estrelas para A Cabeça do Santo, por duas razões: a conclusão do enredo si se apoia muito no acontecimento de um Deus Ex Machina ou dois; a construção dos eventos e resolução dos conflitos poderia ser melhor trabalhada na história. Em segundo lugar, a gordofobia é algo muito presente no livro. Um dos pontos que a narrativa assume o tom irônico é ao descrever e falar dos problemas de personagens gordas que aparecem na história, que só arranjam maridos depois que emagrecem.
Mas, no geral, o saldo de A Cabeça do Santo foi bastante positivo. É uma história divertida, leve, apesar dos momentos mais pesados presentes na trama, que sabe equilibrar bem o enredo com a construção dos personagens.
A Cabeça do Santo está disponível aqui.